Durante o inverno, é comum o apetite aumentar e a vontade de comer tudo o que há pela frente parecer incessante. E você pode até achar essa sensação normal, mas ela tem um respaldo científico que explica o seu motivo.
Segundo um estudo publicado pela revista Nature, neurocientistas identificaram circuitos cerebrais que fazem os mamíferos quererem comer mais quando são expostos a temperaturas frias e, com isso, potenciais terapias que ajudam na saúde metabólica e na perda de peso.
“Os pesquisadores identificaram um aglomerado de neurônios que funcionam como um ‘interruptor’ para esse comportamento de busca de comida relacionado ao frio em camundongos. Sabemos que os mamíferos queimam automaticamente mais energia para manter a temperatura corporal normal quando expostos ao frio”, explica a endocrinologista Dra. Deborah Beranger.
Ainda segundo a especialista, esse aumento do gasto de energia ativado pelo frio desencadeia um aumento no apetite e na alimentação, mas o mecanismo específico que controla isso até então era desconhecido.
Consequências das terapias frias
Segundo a Dra. Deborah Beranger, este é um mecanismo adaptativo fundamental em mamíferos, e direcioná-lo com tratamentos futuros pode permitir o aumento dos benefícios metabólicos do frio ou de outras formas de queima de gordura.
“Como a exposição ao frio aumenta a queima de energia para se manter aquecido, a imersão em água fria e outras formas de ‘terapia fria’ têm sido exploradas como métodos para perder peso e melhorar a saúde metabólica. No entanto, os resultados não são agradáveis, pois o frio, assim como a dieta e o exercício, aumenta o apetite, como ‘efeito colateral’, para neutralizar qualquer efeito de perda de peso”, explica a endocrinologista.
Relação entre circuitos cerebrais e o aumento do apetite
No estudo, os pesquisadores começaram a identificar os circuitos cerebrais que dividem esse aumento de apetite induzido pelo frio. Uma das primeiras observações foi que, com o início das temperaturas frias (de 22 a 3ºC), os camundongos aumentam sua busca por alimentos apenas após um atraso de cerca de seis horas, sugerindo que essa mudança comportamental não é simplesmente um resultado direto da sensação de frio.
“Usando técnicas chamadas de limpeza cerebral total e microscopia de folha de luz, os pesquisadores compararam a atividade dos neurônios em todo o cérebro durante condições frias e quentes. Logo eles fizeram uma observação importante: embora a maior parte da atividade neuronal no cérebro fosse muito menor na condição de frio, porções de uma região chamada tálamo mostraram maior ativação”, diz a médica.
Estudos sobre a ação dos neurônios do “núcleo xifoide”
Eventualmente, a equipe se concentrou em um grupo específico de neurônios chamado núcleo xifoide, mostrando que a atividade nesses neurônios aumentou em condições de frio pouco antes de os ratos saírem de seu torpor induzido pelo frio para procurar comida.
“Quando menos comida estava disponível no início da condição de frio, o aumento da atividade no núcleo xifoide foi ainda maior — sugerindo que esses neurônios respondem a um déficit de energia induzido pelo frio, em vez do próprio frio”, diz o estudo.
Quando os pesquisadores ativaram artificialmente esses neurônios, os camundongos aumentaram sua busca por comida, mas não outras atividades. “Da mesma forma, quando a equipe inibiu a atividade desses neurônios, os camundongos diminuíram sua busca por comida. Esses efeitos apareceram apenas sob a condição de frio, o que implica que as temperaturas frias fornecem um sinal separado que também deve estar presente para que ocorram mudanças no apetite”, diz a endocrinologista.
Resultados da pesquisa na redução do apetite devido ao frio
Em um último conjunto de experimentos, a equipe mostrou que esses neurônios do núcleo xifoide se projetam para uma região do cérebro chamada núcleo accumbens – uma área conhecida por seu papel na integração de sinais de recompensa e aversão para orientar o comportamento, incluindo o comportamento alimentar.
Os pesquisadores acreditam que os resultados podem ter relevância clínica, pois sugerem a possibilidade de bloquear o aumento habitual do apetite induzido pelo frio. Isso permite que regimes de exposição ao frio relativamente simples conduzam à perda de peso com muito mais eficiência.
“Um dos principais objetivos agora é descobrir como dissociar o aumento do apetite do aumento do gasto de energia. Os pesquisadores também buscam descobrir se esse mecanismo de aumento do apetite induzido pelo frio faz parte de um mecanismo mais amplo que o corpo usa para compensar o gasto extra de energia, por exemplo, após o exercício. Com isso, há a possibilidade de criação de medicamentos ou terapias para modular o apetite extra nesses casos”, finaliza a Dra. Deborah Beranger.
Por Paula Amoroso
Fonte: Read More