Uma perspectiva mais poderosa da consciência. Essa é a mensagem principal de um pensador indiano que prega uma abordagem nada tradicional da física quântica. Amit Goswami, autor octogenário de mais de uma dúzia de livros, começou sua trajetória na ciência clássica, como físico teórico. Mas uma epifania, num dia especialmente ruim, abriu sua cabeça para outras possibilidades de pensar e viver.
Em suas obras e palestras, ele procura conciliar a ciência com a espiritualidade, a física com a metafísica, apostando que tudo se concentra na incorporação de propósitos e valores. Como outros que já tentaram unir esses conceitos – que muitos acreditam opostos–, Goswami insuflou detratores. Mas sua mensagem de expansão da consciência vai no sentido de uma humanidade mais empática e amante do autoconhecimento.
Nesta entrevista para Vida Simples, ele tanto aponta os erros do materialismo que se restringe ao pensamento científico quanto os dos dogmas que plantaram as raízes das religiões. Para ele, amor, beleza e justiça são os verdadeiros pontos de evolução na nossa experiência na Terra. Valores que passam por essa união, aparentemente improvável, entre o raciocínio lógico e o sentimento religioso.
1. Como um professor de física teórico passou a se interessar por parapsicologia?
AG: Eu estava numa conferência na Califórnia (EUA), tanto falando quanto ouvindo palestras dos outros. E percebi que as outras pessoas estavam fazendo apresentações melhores que a minha, a ponto de me sentir muito inadequado. Foi uma inveja que durou o dia inteiro do evento. À noite, tive sentimentos terríveis. Fiquei com um certo pânico e, à uma da manhã, fui para a rua, na Baía de Monterey, e senti a brisa do oceano no rosto. Então tive a reflexão: “Por que estou vivendo deste jeito?”.
2. Qual foi a resposta?
AG: Isto veio imediatamente à minha cabeça. “Eu não tenho de viver assim. Eu posso integrar meus pensamentos com a forma como eu vivo.” Porque viver é basicamente ter relacionamentos. Mas, para pessoas ambiciosas como eu era, havia muito foco em trabalho, quase nada em relacionamentos. Foi um período muito confuso em favor de tudo que estava fora de mim, e nada dentro. Aí, então, passei a me interessar pelo que estava do outro lado das coisas.
3. Por que a parapsicologia pode ser uma conexão entre a ciência e a consciência?
AG: Geralmente as pessoas chamam de psicologia científica aquela que é comportamental, cognitiva. Só que metade da cultura tem uma forte orientação para valores espirituais. E a parapsicologia, embora não faça parte da academia, integra a cultura. Quando cheguei com a ideia de que a consciência é a base de todo o ser, e todas as experiências vêm de possibilidades da consciência por meio da escolha, isso causou uma comoção entre os grupos de psicologia. Minhas teorias tiveram um impacto imediato e, ao longo dos anos, fui me tornando capaz de integrar ciência e consciência cada vez melhor.
4. Como sua abordagem da física quântica pode expandir a visão da realidade?
AG: Mesmo na década de 1920, o materialismo científico ainda não havia sido declarado como a visão de mundo oficial dos cientistas. Há paradoxos nessa forma de pensamento. Como um objeto pode ser ao mesmo tempo onda e partícula? Esses paradoxos não podem ser resolvidos se permanecermos com o que mais tarde se tornou um dogma, a matéria movendo-se no espaço-tempo, sendo essa filosofia a única coisa. Precisamos assumir que existem potencialidades que residem num domínio separado, fora do espaço e do tempo.
5. Que mudanças você gostaria de ver no mundo com a disseminação do conhecimento que postula há décadas?
AG: A forma como encaramos os valores. Desde que pessoas espirituais, como Jesus, Buda e Sócrates, apresentaram a sua metafísica espiritual, a consciência é a base de todos os seres e ela tem alguns aspectos de unidade. Nós os chamamos de arquétipos, tais como amor, beleza, justiça, verdade, totalidade. Ao explorá-los, podemos mudar desde o nível básico da condição humana, que consiste em coisas muito familiares, mas muito rígidas: equívocos, emoções negativas, ênfase no prazer, no entretenimento e, claro, vício em informação.
6. E como mudar isso?
AG: Os valores podem mudar tudo. Essa já era a ideia da tradição espiritual, mas as religiões apresentaram seus valores de tal forma que as pessoas se sentissem obrigadas a segui-los, por medo do castigo. Apesar de que seus líderes nunca praticaram os valores que empurravam para os outros. Então, não funcionou. E os cientistas cansaram dessa hipocrisia, refletindo inicialmente que os valores não existem. Só que, sem eles, haverá conceitos negativos nos relacionamentos, e a civilização não pode ser feita dessa maneira.
7. Qual foi a solução para essa divergência, então?
AG: Começaram a inventar valores. Se não há uma realidade fundamental, precisamos dar-lhes uma forjada pelo homem, como se criássemos leis para evitar que as pessoas se tornassem criminosas. Mas é claro que isso também não está funcionando. Portanto, a maior conquista da visão de mundo quântica é nos reencantar com os valores. Porque eles são reais. A física quântica pode incluir a ideia de propósito em nossa vida, que é explorar criativamente os valores que os incorporam.
8. Você diria que é uma teoria em prol da felicidade?
AG: Seguindo a física quântica, podemos embarcar numa jornada de transformação que vai nos levar a mais felicidade. Mas começar é difícil, porque as pessoas confundem felicidade com aquisição de prazer. O entretenimento, que hoje predomina no mundo, nos dá prazeres momentâneos que são sentidos como algo positivo. Entretanto, o prazer é o resultado circunstancial de uma ação das moléculas do cérebro, ao passo que sentimentos baseados em valores tornam a experiência humana transcendente.
Por Alex Martins – revista Vida Simples
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